
Aprovação obrigatória
Chegamos ao penúltimo passo para completar o projeto governamental para a educação brasileira: o Conselho Nacional de Educação aprovou a resolução de que nas três primeiras séries do Ensino Fundamental a aprovação será obrigatória, tenha ou não o aluno atingido as metas propostas e adquirido ou não o conhecimento necessário para embasar os conteúdos seguintes.
Em tese (veja bem: eu disse “em tese”), pode chegar às pequenas redações sem estar completamente alfabetizado e à multiplicação de números fracionados sem ter aprendido a somar números inteiros. Sem possibilidade de ser barrado: o conhecimento não alcançado ficará para que o professor da série seguinte tente ensinar, individualmente, enquanto coletivamente apresenta os conteúdos novos a todos os cerca de trinta alunos, inclusos aqueles que não conseguiram alcançar o conhecimento anterior, que seria base para o novo conteúdo.
Pode ser surpreendente para muitos, mas não para quem acompanha o processo educacional recente, em que a escola passou a ser pressionada para oferecer “recuperação preventiva”, “recuperação terapêutica”, “provão final”, “recuperação do provão”, recuperação da recuperação, recuperação por trabalhos, aprovação pelo Conselho de Classe e todos os artifícios possíveis para aprovar quem não alcançou – seja por falta de condições ou por falta de vontade – os conteúdos e metas propostas.
No meu último ano de magistério cheguei a ser chamado, das férias para oferecer “recuperação” a um aluno que (por vontade própria, com assentimento da mãe, registrado na Supervisão Pedagógica) havia participado, durante todo o ano letivo, de apenas três (sim, eu disse “três”) das cento e quatro aulas que eu havia ministrado à turma da qual ele fazia parte.
Mais surpreendente que isso, é ver que há uma “coerência” por trás das medidas tomadas, que visam o nivelamento por baixo e a aprovação maciça, trocando qualidade por quantidade. Nesse contexto “coerente” o professor que reprova não é tão bom profissional quanto aquele que aprovou todos os alunos, independentemente da metodologia de avaliação (provas em conjunto, provas com consulta de anotações, etc).
Há alguns anos, em artigo publicado por um dos jornais locais, fiz referência à supressão da avaliação de inglês para os candidatos a diplomata, aprovada por Celso Amorim. Jocosamente ainda perguntei como se comunicariam, em atividades internacionais, se por mímica ou em tupi-guarani.
Seguiu-se com a eliminação da necessidade de diploma de Jornalismo para ser jornalista, entre outras medidas que não repercutiram tanto junto ao público (cotas, eliminação do processo vestibular, etc).
Mas tudo isso fez parte da caminhada a que chegamos ao último passo. Resta o último, que será o fim de todo e qualquer processo de avaliação desde à primeira série (ou ciclo) do Ensino Fundamental até a entrada no Ensino Superior. Resta, a mim e uns poucos, apenas lamentar.
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