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Do Tempo do Epa - 20/10/10

Por C. Henrique Mércio

NUNGESSER ET COLI

Muita gente acredita que o piloto norte-americano Charles Lindbergh, tenha sido o primeiro piloto a voar sobre o Oceano Atlântico, em 1927, fato que o tornou célebre, como um dos aviadores mais famosos do mundo.

Para outros entretanto, o “Águia Solitária” seria o segundo a realizar tal proeza e que o mérito pelo pioneirismo pertenceria aos pilotos franceses Charles Nungesser e François Coli (na verdade, a primazia coube aos britânicos John Alcock e Arthur Whitten Brown, em 1919). Sem GPS, telefonia móvel e outros recursos, quem seriam esses malucos?

Nos anos dez do Século XX, o ainda novo mundo da aviação foi sacudido por um desafio diferente: um prêmio de US$ 25.000,00 para quem realizasse a travessia sem escalas do Atlântico. Muitos pilotos foram tentados a ganhá-lo. A grande maioria imaginava o trajeto decolando de Nova Iorque e pousando em Paris.

Veterano dos combates aéreos da I Guerra Mundial, o capitão François Coli interessou-se pelo feito. Experiente navegador, Coli planejou uma rota diferente: partir de Paris e atingir Nova Iorque. Membro da Legião de Honra francesa, o capitão já realizara vários vôos sobre o Mediterrâneo e em 1923 planejava ir além, formando dupla com outro ás da guerra, o piloto Paul Tarascon.

Mas em 1926, Tarascon destruiu num acidente seu Potez 25 Biplano. Ferido por queimaduras, foi substituído na equipe pelo herói de guerra Charles Eugene Jules Marie Nungesser, um dos pilotos com mais vitórias em combate, totalizando 40 inimigos abatidos. A dupla partiu então para um novo projeto de avião, o Biplano Levasseur PL8, baseado no modelo de reconhecimento PL4.

Trabalhando na própria fábrica da Levasseur em Paris, sob a coordenação de Emile Farret e do gerente Albert Longelot, foi removido o espaço dos dois cockpits, substituídos pelos tanques de combustível. Adicionou-se também um reforço na fuselagem para permitir uma amerrisagem (pouso na água).

Os três enormes tanques comportavam 1.056 galões ou sejam, 4.025 litros de combustível e ficavam à frente da carlinga, que fora alargada, permitindo que Nungesser e Coli sentassem ao lado um do outro.

O motor, um Lorena-Dietrich W12 tinha 450 cavalos e foi longamente testado para certificarem-se de que não apresentaria problemas, funcionando ininterruptamente por 40 horas, ainda na fábrica de Paris.

Por fim, o aparelho foi pintado de branco, exceto pela cauda, que recebeu as cores da flâmula francesa e do curioso símbolo pessoal do piloto Nungesser, a caveira e as tíbias cruzadas, além de velas e um caixão, pintados sobre um coração negro. Batizado L`Oiseau Blanc (o Pássaro Branco), o avião não dispunha de rádio, pois os tripulantes concluíram que aumentaria o peso do conjunto.

Da mesma forma, o biplano fora construído com um trem de pouso “descartável”. A engrenagem só servia para ajudar no taxiamento do Pássaro Branco e desprendia-se da fuselagem quando este alçava vôo. Para pousar, fazia-o como um hidroavião e descia na água.

Outro detalhe que tornava um rádio desnecessário era a destreza de Coli na navegação celestial. E por fim, a tripulação: o capitão Nungesser era um típico aventureiro. Antes da guerra viajara pela América do Sul e esteve no Rio de Janeiro e depois Buenos Aires, à procura de um tio desaparecido.

Na Argentina trabalhou como mecânico de automóveis, tornando-se um corredor. O mundo porém estava em guerra e quando retornou à França, Charles interessou-se pela aviação de caça, integrando a famosa Esquadrilha Lafayette (composta de voluntários norte-americanos).

Mulheres bonitas, vinho, carros velozes, a vida de Nungesser era bastante movimentada e ele foi várias vezes condecorado por seus feitos em combate mas desgostava-o a disciplina militar, tendo sido várias vezes repreendido por voar sem autorização.

Ao final da I Guerra, o inquieto piloto estava nos Estados Unidos trabalhando como dublê em filmes sobre combates aéreos. Foi quando ouviu falar sobre o vôo transatlântico.

Dez anos mais velho (35 x 45), o capitão Coli parecia mais sóbrio que seu parceiro. De menor estatura e rosto redondo, trazia sobre a vista direita um chamativo tapa-olho, lembrança de guerra, mas que não perturbava sua capacidade de orientação e observação. Era casado e tinha três filhos.

Às 5:17 A.M. de 8 de maio de 1927, decolaram de Le Bourget para a grande aventura. Plano de vôo: sobrevoariam a parte sudoeste da Inglaterra e Irlanda, depois através do Atlântico iriam até Newfoundland, rumando para o sul e pousando sobre águas em NY.

O Pássaro Branco ainda foi avistado sobre a cidade litorânea francesa de Etretat, e então, desapareceu sem deixar rastros. O que poderia ter ocorrido?

Problemas mecânicos teriam acometido o L`Oiseau Blanc sobre o oceano. Nesse caso, só um milagre salvaria seus pilotos. Muitos acreditam que os franceses teriam conseguido completar parte da jornada e atingido o Maine. O morador Anson Berry alega ter ouvido um avião sobrevoando sua propriedade em Round Lake, no final da tarde de 9 de maio de 1927.

Destroços encontrados na área reforçam essa tese, mas nunca houve uma confirmação oficial, ou a história passaria por uma revisão. Como saíram de Paris doze dias antes da chegada de C.Lindbergh, estes capitães é que seriam celebrados pela travessia transoceânica e seus herdeiros é que teriam o direito aos vinte e cinco mil pacotes.

Nunca se soube o paradeiro dos pilotos ou de seu avião, que deixaram para trás o trem de pouso do Levasseur. Essa peça encontra-se hoje exposta no Museu do aeroporto de Le Bourget e é a prova de que eles não eram uma miragem.

Comentários

Anônimo disse…
Volto feliz.
Ofereço ao Elbio, velho amigo de muitas jornadas.

C.Henrique

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